sábado, 26 de abril de 2014

Ciclo da mente



À minha direita o chafariz da Redenção, logo à minha frente um casal se amassa na grama. Eu escrevendo e ouvindo Pantera às ganhas, como se nada no mundo importasse.

Minha mente me questiona sobre o porque de escrever. Respondo que não sei, que escrevo para crescer, me entender, pra chamar a atenção, podem ser vários motivos. Um brainstorm só serve pra complicar minhas ideias. Não consigo chegar a nenhuma conclusão. Então continuo escrevendo por escrever, descobrindo milhares de coisas com a literatura e não descobrindo o motivo de ela ser importante pra mim.

Aí tu vai me dizer que justamente a importância dela é justamente eu descobrir milhares de coisas. Mas não funciona desse jeito. Estou lendo Clube da Luta, um livro ácido e irônico. Li antes O Menino do Pijama Listrado, uma obra triste e iluminadora, que foi precedida por Realidades Adaptadas, do Philip K. Dick, ficção científica na sua mais pura forma. E no princípio de toda essa bagaça estavam as obras de fantasia.

Não funciona desse jeito pelo fato de isso ser a consequência, não o objetivo. Há algo que busco nas palavras que crio e que leio que ainda não foi decifrado. Pode chamar de elevação espiritual, crescimento pessoal, ascensão da casa do caralho. Mas não reduza a descobrir milhares de coisas.

O nascimento desse blog é tudo culpa da Luiza. Apareceu do nada e assim do nada sumiu. Um fantasma, aquela filha da puta linda que com meia hora de palavras derrubou minha muralha de medo de criar e mostrar ao mundo minhas ideias ridículas. Houve outras pessoas no caminho, não nego, mas ela foi um caso estranho demais até para se chamar de caso à parte.

Morena. Rush. La Villa Strangiatto. Unhas brancas. Um beijo molhado. Escreva. Escreva.

Comecei a não só criar, mas mostrar. Sem vergonha. Sem medo. Já me perguntaram quando sai o livro. Que livro, meu jovem? Não há mais livro. Se o livro vier, virá, tão singelo como minhas ideias que do nada vêm e para o nada vão.

- Não é pra mostrar o quão bem tu escreve. Não é pra ter elogios. Larga disso. Tu tem que ser criticado. A porrada fortalece os ossos, tu aguenta mais, te torna mais forte, te liberta do medo e da acomodação. É pra falarem mal.

Digo que não sei se aguentaria. Mentira. Tu aguenta. Tu tem medo, te borra disso. Uma coisa com o medo é que tu não tem que vivê-lo, tem que aceitá-lo. Não é eu tenho medo e sim tenho medo e foda-se. Sinta o medo como uma emoção e não como um terror e tudo fica mais fácil.

Ela não me chama de babaca porque sabe que eu me ofenderia. Mas eu sou, sei disso.

Do meu lado tem duas mulheres abraçadas. Uma diz que não quer sair dali nunca mais. A outra ri. Uma hora tu vai ter que sair. Uma hora todo mundo tem que sair e sentir o abraço frio do mundo. Então escreva.

Eu já amei uma vez. É bom pra caralho amar. E como tanto amei, desamei. E consegui. Saí desses braços. As gurias se beijam com amor. Não é cálido, mas é intenso, com mais coração que tara. Sinto inveja e admiração. A guria sai dos braços da outra, levanta. Escrevo.

Luiza me olha. Ela não me beija, apenas me instiga. Aqueles lábios brilhantes só riem e falam. Provocam. Me excitam. Me exercitam.

Volto aos meu pensamentos. Eu comigo mesmo. Meus Dois Pândegos discutindo sobre o tom do que lerei ou produzirei. Quero fazer sozinho, com minhas ideias perdidas.

Sem ninguém por perto.

Mas a Luiza me olha com aquela curiosidade debochada. Ela parece crescer junto com meu texto. Mas tento olhar pra ela e apenas vejo um senhor muito velho andando numa bicicleta sem marcha lentamente. Faceiro que só. Como se fosse seu primeiro passeio. Ele ainda tem medo de cair. Sinto em sua mão firme no guidão. Mas ele não para. Segue seu passeio. Medo como aventura. Emoção.



O mesmo sorriso de 70 anos atrás. Genesis. Supper's Ready. Mão firme. Escreva.

E eu aqui olhando as pessoas, o mundo e pensando a respeito. Decidindo que o pândego número 1, o mais reflexivo e sensato, é que vai assumir hoje. A coisa é séria, uma jornada de autodescobrimento pra mim. Por isso me inspiro melhor quando estou na rua. Gosto de ver as pessoas, seu medos, sua convicções. Os olhos e as mãos falam muito.

Ninguém fala mais que a Luiza, porém. Falei com ela por meia hora. Ela continua falando comigo até hoje. Nem sei se ela existe de fato. Mas por trás do meu ombro ela apoia seu queixo, eu consigo sentir o cheiro gostoso de sua pele. Luiza entra nas minhas ideias, mexe com meus brios, me instiga.

- Não para.